COMPRA-SE UM ABRAÇO
Quero comprar um abraço. Não precisa ser inteiro, nem de primeira mão. Pode ser incompleto, pela metade, usado, com resquícios de carícias infantis, ou manchado de risos das longas horas juvenis. Ou então, que seja um abraço terno, com marcas de choros inocentes das noites não dormidas ou, ainda, calejado pelas agruras das tardes plenas de outrora. Sendo usado, aceito que tenha alguns arranhões produzidos por encontros inesperados, algumas marcas de alegrias impregnadas pela espontaneidade de sua operação. Aceito, inclusive, que tenha embalagem desgastada, mas exijo uma garantia: que possua boa bateria para conservar o entusiasmo e fazer funcionar a alegria durante o uníssono pulsar de dois corações. Pode ser de qualquer modelo ou ano de fabricação, mas há de ter procedência sincera de boa intenção. Hoje, ao arrumar pertences emocionais, encontrei metade do meu abraço, totalmente abandonado. Tirei-lhe o pó e o guardei de novo. Está aqui comigo, falta-lhe o movimento característico. Está incompleto e encontra-se um pouco desalinhado em virtude do desuso. Permanece guardado sem nenhuma utilidade por falta de completude, mas percebi que ainda conserva o calor que lhe confere vida. Preciso comprar a outra metade que plenifique o meu abraço em sua totalidade para que entre em operação com sua capacidade real. Quem me vende a metade de um abraço? Do livro "Bazar dos Poetas" - 2013 Ileides Muller
Enviado por Ileides Muller em 15/11/2013
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